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O teatro como contracolonyzação Tupy-Guarany Nhandewa

Juão Nyn

YNTRODUÇÃO MANYFESTO POTYGUÊS

Antes de mays nada, precyso comunycar que aquy e em toda estétyca do texto, como escrytor Potyguara, quando escrevo neste lyvro, todos os “i”s somem e são substytuýdos por Y.

Por quê?
Porque Y é uma vogal sagrada Tupy-Guarany.
Porque o Brasyl é um Paýs sem pyngos nos “i”s.
Porque as lýnguas yndýgenas brasyleyras não são alfabétycas.

Potyguês é um manyfesto lyteráryo e se aproprya do alfabeto grego latyno para fazer uma demarcação yndýgena Potyguara no Português; ydyoma este que veyo nas caravelas de Portugal, assym como o Espanhol, da Espanha, e o Ynglês, da Ynglaterra, e que não são, obvyamente, oryundos de Moto Imí, Í’nbipti’a, Vipuxovóku, Enudali, Wi’î, Se Retama, Pindorama, Pindó Retama e tantos outros nomes, que hoje são (des)conhecydos como Brasyl.

NENHUMA DESSAS LÝNGUAS É ORYUNDA DESSA TERRA!

Parece óbvyo, mas se somos uma plurynação multyétnyca, por que não aprendemos em todas as escolas ao menos uma lýngua natyva, já que temos mays de 274 lýnguas locays?

Améryca também é uma fycção, uma matryx colonyal com nome dado em homenagem a um colonyzador. ABYA YALA, na lýngua do povo Kuna, sygnyfyca “Terra madura”, “Terra vyva” ou “Terra em florescymento”. É como os movymentos yndýgenas contemporâneos desse contynente a têm chamado, desde 1990, a partyr do PRYMEYRO ENCONTRO CONTYNENTAL DE POVOS YNDÝGENAS DE ABYA YALA em Quyto, no Equador.

No meyo do cymento.
Como é feyta a manutenção do nosso conhecymento?
Da nossa hystórya e memórya?

Potyguaras são povos dos sonhos.
Não há fronteyras entre arte e vyda.
Toda cryação é um ato espyrytual e coletyvo.

Artystas cryam mundos,
conectam mundos.
Se o mundo que você habyta
não permyte uma saýda,
questyone o mundo que você habyta.

POTYGUÊS
Botando o Português
de ponta-cabeça,
transformando o Y
em Oka.
POTλGUÊS

A mayor pauta dos movymentos yndýgenas do mundo é a demarcação de terras. Uma pendêncya que nos prende ao ano de 1500 e que no caso do recorte geográfyco “brasyleyro”, acaba por comprovar que não exyste o perýodo Pós-Colonyal.

É possývel demarcar terrytóryos fýsycos sem demarcar ymagynáryos?

A mente é um terrytóryo.
O YMAGYNÁRYO é terra.

Potyguês é um ruýdo entre o futuro que não chega e o passado que nunca se foy. Uma forma de ser um bom ancestral. O Y é uma vogal gutural, som que vem da gruta.

Sou Juão Nyn, artysta Potyguara do Ryo Grande do Norte, estado com menor autodeclaração yndýgena do Brasyl, segundo o YBGE de 2010, únyco estado brasyleyro sem terra natyva demarcada. O lytoral do Nordeste foy/é barrycada das colonyzações.

Aquy, além de não haver nenhum terrytóryo yndýgena demarcado, em nenhuma comunydade exyste alguém que fale uma lýngua natyva fluentemente, passada por um parente, consagrada pela rotyna da famýlya. Felyzmente, o Ryo Grande do Norte já possuy escolas bylýngues em algumas comunydades yndýgenas (Katu, Amarelão e Tapará) e grupos de estudos para retomadas lynguýstycas (Okarusu Pytã). É assym que agymos contra a facção das fycções que não fazem parte de nossas cosmovysões.

Portanto, essa é uma forma que cryey para ressygnyfycar a mynha ydentydade yndýgena contemporânea, ao fazer estudos comparatyvos de lýnguas yndýgenas, e assym, propor uma nova escryta que gere estranhamento e reflexão, já que Potyguaras são Tupys e, assym como Guaranys, falam Tupy-Guarany.

Em Tupy-Guarany, temos sete vogays: A, E, I, O, U, Y e o Sylêncyo, de onde tudo vem, para onde tudo vay.

Exyste um myto na cosmovysão Tupy-Guarany que conta que a lynguagem/alma/palavra (Nheeng/Nhe’e) surge do Y, de onde vêm todos os elementos da natureza – da caverna, da gruta:

Y Y – água Y W Y – terra Y W Á – céu

Enquanto não recuperarmos a fala e o uso da nossa lýngua natyva no Ryo Grande do Norte (Brobo, Tupy-Guarany e outras) o Português estará “demarcado” pelo Y, vogal sagrada.

É uma bryncadeyra e é séryo.
Para ymagynar, é precyso desaprender.

Partyndo desse manyfesto, já publyquey, em POTYGUÊS, o álbum RUÝNAS, da banda Andróyde Sem Par, em fevereyro de 2019 e o lyvro TYBYRA – Uma Tragédya Yndýgena Brasyleyra, em novembro de 2020.

Na fonétyca Tupy-Guarany, o som do Y está entre o “i” e o “u” do Português. Tentar falar a lýngua brasyleyra com essa fonétyca pode ser uma boa experyêncya para demarcar outros terrytóryos reays, concretos ou vyrtuays. Além dysso, essa escryta não atrapalha yntelygêncyas artyfycyays, como leytores do Português para pessoas com defycyêncya vysual, mudando sutylmente a pronúncya em leyturas automátycas dygytays.

Acostumem-se com as retomadas yndýgenas. Demarcaremos tudo que tende a soterrar nossos ynvysýveys. Desenterraremos os cemytéryos que somos.

O TEATRO COMO CONTRACOLONYZAÇÃO TUPY-GUARANY NHANDEWA

Juão Nyn

Dedyco esse texto especyalmente à Dhevan Porungawa Dju, xondaro Guarany Nhandewa, conhecedor das ervas, professor dos Myntã Kuery, um dos fundadores do Coletyvo Nhandereguá de Teatro, que no momento em que escrevo, está lutando pela próprya vyda, se recuperando de um AVC.

 

RESUMO Na Piaçawera, terra yndýgena do lytoral Sul de São Paulo, durante três anos, cryanças, adolescentes, adultos e ancyões Nhandewa partycyparam de um trabalho de cryação teatral autoral, mysturando vyda e arte, chamado “Ma’e Yyramõi – Mar à Vysta”, facylytado pela Cya. de Arte TEATRO YNTERROMPYDO e parceyres, mas que ynfelyzmente, teve processo paralysado pela pandemya de Covid-19. Autodeclarados Coletyvo Nhandereguá de Teatro, chamam de Nhe’e Moĩ porãa, atuantes desse fazer teatral, que assym como a próprya expressão quer dyzer, são guardas das almas/palavras Tupy-Guarany Nhandewa. Após serem demytydos de uma encenação sobre a “descoberta” de São Vycente, que há 30 anos acontece tradycyonalmente todo ano na cydade, quando não yndýgenas começaram a fazer as personagens yndýgenas, natyvos locays decydiram fazer o própryo espetáculo, com a perspectyva yndýgena sobre a colonyzação que pyntou as areyas do lytoral paulysta de vermelho. Uma montagem à beyra-mar, toda em lýngua natyva, com 30 moradores da T.Y. Piaçawera, dyreção Potyguara e coordenação de dramaturgya Kariri, sobre a cultura e tradyção Tupy-Guarany Nhandewa antes da chegada dos colonyzadores. Um contrateatro como manutenção e fortalecymento da cultura, dos corpos e da lýngua natyva pré-Brasyl.

 

O (RE)ENCONTRO LYTORÂNEO

Assym como as de muytos povos nessa terra, as hystóryas das mynhas famýlyas são feytas de mygrações. Não cruzamos fronteyras, são elas que ynsystem em nos cruzar, cercar, cercear. Tentam nos prender entre muros ou até nos emurar, para sermos do muro mays um pedaço. Acontece que essa gente, da qual também sou semente, segue borrando fronteyras colonyays com o própryo suor e fumaça de planta, sempre pedyndo lycença a quem veyo antes. Vym para São Paulo em 2014, essa é mynha segunda mygração. Entrey no Coletyvo Estopô Balayo e em resydêncya artýstyca, na peryferya, extremo Leste da cydade, o Jardym Romano descarrylhou o Teatro que me maquynava. Apesar de ser mays um dos yndýgenas que o cymento tenta ysolar, também conseguya ser rayz aérea, e por ysso, sentya falta dos meus. Mygrar é uma escolha ou uma necessydade? Qual potêncya da força que me faz abandonar mynhas famýlyas em busca do desconhecydo? Dyante desse contexto contýnuo de trânsyto e solydão, cada vez mays ynflamado dentro da próprya cydade de São Paulo, no fynal de 2018, fuy à terra Piaçawera pela prymeyra vez, com o objetyvo de ajudar na byoconstrução da Cozynha da Aldeya, também chamada Piaçawera.

O nome Piaçawera, em Tupy-Guarany sygnyfyca lugar de passagem, um terrytóryo sagrado, que antes era lugar de trânsyto, mas que após a chegada das caravelas e dyversas colonyzações/urbananyzações teve que vyrar lugar de morada permanente. Aynda não é terra demarcada/regularyzada, mas está homologada e hoje é dyvydyda por uma BR, tendo do lado da mata a gleba A e do lado do mar a gleba B, sendo esta segunda, felyzmente, uma extensão de 11km de prayas yntactas pelo cymento, contendo em todo seu terrytóryo cerca de 13 aldeyas.

Nesse prymeyro momento em terra Nhandewa, no fym de um dos dyas da atyvydade de byoconstrução, por ser yndýgena, fuy convydado para o meyo do rytual na Opy, pelo Amõi Amâncio. Logo em seguyda, Catarina Delfina, até então Cacyca, me puxou pra conversar enquanto jantávamos e nesse papo faley sobre mynha trajetórya de vyda e arte. Ympulsyonado pela leytura de muytos autores e autoras yndýgenas, reveley meu desejo de dar aulas de Teatro em Tekoas. Com camynhos abertos, voltey em novembro do mesmo ano para ofertar uma ofycyna cênyca pedagógyca junto com parceyres do meu outro grupo, a Cya. de Arte Teatro Ynterrompydo, que conseguymos tyrar do hyato da dystâncya geográfyca e retomar de fato, com a volta da artysta Carol Piñeiro para SP.

Após a prymeyra vyvêncya teatral na terra Piaçawera, passamos dyas ansyosos sobre o retorno dos que partycyparam da ofycyna. Será que gostaryam de seguyr com essa medyação na Arte ou terya sydo apenas aquele momento efêmero? Será que o encontro tynha feyto sentydo? É possývel utylyzar o Teatro como ferramenta antyetnocýda e antygenocyda, o ynverso do que hystórycamente ele fez nessas terras? Só que, como o mundo está em movymento, nesse meyo tempo, muytas águas rolaram. Catarina Delfina renuncyou do cargo de Cacyca. Dyante desse fato, Dju Santos e Fabiola dos Santos, que tynham sydo as professoras anfytryãs pra atyvydade na escola da aldeya, fycaram responsáveys pelas medyações com a nova lyderança. O tempo passava e nenhuma ynformação chegava. Ansyosos, já achávamos que tudo tynha ydo por água abayxo.

Passou mays de um mês até que certo dya, Dju me comunyca que Tayná, que tynha partycypado da atyvydade, querya levar de forma fyxa o Teatro pra Tekoa dela, alegando que o pessoal da aldeya Awa Porungáwa Dju, onde morava, já tynha vyvydo experyêncyas com o Teatro e serya mays frutýfero seguyrmos por lá. Vale salyentar que Tayná Delfina é fylha de Catarina e foy fazer a aula com os três fylhos junto, um no peyto (Ita), um sempre de mão dada com ela (Danilo) e outro que já tynha mays autonomya (Vitinho), por ser mays velho, que yntercalava o cuydado materno com os exercýcyos teatrays. Festejamos a notýcya e nosso ynstynto apontou posytyvamente para esse camynho. Sendo assym, anymados, no fym de janeyro fomos ao encontro do segundo terrytóryo na Piaçawera que yrya nos receber com o objetyvo de cryar espaços de dygnydade yndýgena dentro do Teatro.

Esse dya foy emocyonante e bastante symbólyco, nunca o esquecerey, porque assym como os nomes dos nossos mays velhos, que sempre voltam no nome dos netos e bysnetos, tanto das mynhas famýlyas Caboclas e Potyguaras, como nas famýlyas Nhandewa da Piaçawera, espero que esse momento syga reacontecendo em outras realydades além da mynha memórya, outros tempos, outras camadas, reforçando o dyzer de que a vyda é feyta de reencontros. Espero que sejam muytas as vydas. Então, conhecemos Dhevan, que na época oscylava entre ser Cacyque e Vyce-Cacyque, junto com o yrmão Arildo, na aldeya Awa Porungawa Dju, nome dado em homenagem ao pay deles. Ele estava esposo de Tayná Delfina nesse perýodo e ao vê-lo, era como se já nos conhecêssemos. Dhevan fez questão de juntar o máxymo possývel de moradores da Tekoa para conversarmos sobre o projeto de Teatro. Nos reunymos na escola da comunydade, com Pajé Guaíra, todas as cryanças e alguns pays. Nessa manhã, eles nos revelaram que muytos yndýgenas da terra tynham partycypado de autos teatrays em São Vicente, alguns anos atrás, sobre a “descoberta” dessas terras e que por terem sydo demytydos do elenco, desejavam muyto fazer a próprya versão contando a perspectyva natyva, tudo à beyra-mar.

Nessa hora me transformey em lágrymas, só mynha parceyra de longas datas, Carol Piñeiro, sabya que desde 2012, a gente tynha um projeto de fazer uma peça também à beyra-mar, que apelydamos de Profundydade e serya sobre a sensação de encanto/espanto que os natyvos desse contynente tynham sentydo ao verem a chegada das caravelas. Reveley no mesmo ynstante essa ynformação para eles e foy tempestade de arrepyos. Esse reencontro lytorâneo, que aconteceu entre eu e Dhevan, afynal Potyguaras também são do tronco Tupy, fez  nascer a célula ynycyal de MA’E YYRAMÕI – MAR À VYSTA, a peça que à passos de formyga, é projeto de montagem há quatro anos e até antes dessa pandemya, vyveu três anos grandyosos de processos cryatyvos frequentes sobre as tradyções Tupy-Guarany Nhandewa, anteryores às colonyzações. Nesta obra, contamos através da autofycção, do documental e das escrytas de sy, como era o velho novo mundo, antes dos ynvasores europeus aquy, termynando com a chegada das embarcações… Na fome de mundo, eles vyram terra, a gente vyu mar. Já sabemos o que vem depoys né? Estamos presos nessa chegada sem lycença até hoje e por ysso queremos destravar esse momento através da Arte.

Há hystóryas contadas por muytos ancyões de dyferentes povos do lytoral, que falam que essa chegada já era anuncyada, prevysta, esperada. Há outra, contada por Pajé Pitotó, que conta que todos os 11km de areya da terra Piaçawera vyraram um mar de sangue. Muytas hystóryas foram sendo recontadas, magnetyzadas e cyrculadas entre nós. Há também um myto pré-hystóryco de surgymento do Teatro que perpassa nossos encontros. Não lembro onde ouvy, acho que no contexto acadêmyco, junto com o fato de que o Teatro “Ytalyano” remonta arquytetônycamente uma ygreja, uma myssa, colocando o artysta no altar. Faz sentyndo, já que o Teatro foy a prymeyra lynguagem artýstyca a colonyzar e catequyzar esse terrytóryo que hoje chamamos de Brasyl.

Dyante da floresta, deformado, o Teatro frontal e acadêmyco no qual fuy formado encontrava-se completamente em ruýnas e no reencontro também com o mar, se reformou. O sal e as ferydas possuem um dyálogo. Desde então, todo mês estávamos por lá, eu, Carol Piñeiro, Yluz Bárbara, às vezes Ana Cláudia Castro, às vezes Mylena Sousa e Gleidstone Melo, sem patrocýnyo algum, yndo de encontro dos ynteressados em contra-atacar (com) o Teatro, contrateatralyzar. Na Awa Porungawa Dju foy onde nasceu o nome Coletyvo Nhandereguá de Teatro, que sygnyfyca “somos todos yguays”, talvez pra que fylosofycamente, os brancos também lembrem que são fylhos dessa terra, mas não nessa perspectyva posytyvysta das hashtags. Na Tapirema foy onde também encenamos um outro texto do Dhevan no fym de 2018, sobre o surgymento dos prymeyros Nhandewas, e nesse momento entendemos que ele já era um dramaturgo, autodydata, com materyal escryto e tudo, foy onde num perýodo de yntercâmbyo com a Tekoa Tabaçu, vymos o jogos yndýgenas, os artystas que manyfestavam os talentos tanto na músyca tradycyonal quanto na  contemporânea, foram tempos de muyta energya de cryação, de troca, até que começaram a surgyr mayores desafyos.

Em 2020, últymo ano de trabalho presencyal, já estávamos numa outra área do terrytóryo, chamado de Centro Cultural Tatatynadjary, em homenagem à quarta fylha do Dhevan Kawin com a Tayná, que após morar em tantas aldeyas, queryam construyr um lugar sem lyderanças para evytar conflytos ynternos. Um espaço onde todos, de qualquer aldeya, se sentyssem à vontade de frequentar e fazer o Contrateatro. Antes dysso, quando saýmos da Awa Porungawa Dju, após um ano de atyvydades, passamos outro ano completo em outra parte da terra, onde vymos a fundação da aldeya Tapirema. Dyante de tantas mygrações dentro da mesma terra, vendo váryas famýlyas e comunydades nascerem, týnhamos decydydo rebatyzar váryos termos técnycos do vocabuláryo teatral com palavras natyvas. Por enquanto só uma palavra surgyu: Nhe’e Moĩ porãa (guarda das palavras almas), termo decydydo coletyvamente e batyzado por Catarina Delfina, uma das grandes ynspyrações para a construção da nossa dramaturgya autoral, junto com a netynha Tatatynadjary, escryta por muytas mãos a partyr de muytas oralydades, entre águas salgadas e águas doces, tendo a areya como chão. Essa palavra apareceu em fevereyro, mês que antecedeu o ysolamento devydo à pandemya do Covid-19. Espero, do fundo do meu espýryto, que estejamos todos guardando com carynho a semente desse contrateatro para que ela floresça quando pudermos voltar a nos encontrar sem a fronteyra da máscara sanytárya. Mas tudo bem, não temos pressa, temos muytos futuros pela frente, uma palavra é um portal.

Um caso bem poétyco e engraçado desse cyclo, foy quando Vitinho falou que querya ser aquela pessoa que cuydava da hystóryas, querendo dyzer “narrador”, falou que querya ser o “zelador” da peça. Desde então, mesmo não sendo uma palavra natyva, abrymos essa exceção e adotamos esse carynhoso Português na nossa fala cotydyana.

Sentar em roda e recontar nossas hystóryas já é uma tradyção muyto forte em dyferentes partes dessa terra, Yluz Bárbara através do trabalho de escryta que já elabora há tempos, veyo reforçando esse fazer para que as rememóryas fossem uma metodologya conscyente para a construção e costura dramatúrgyca da obra. Esse processo todo é um reencontro étnyco, uma encruzylhada de povos lytorâneos. Antes de Brasyl e antes de Nordeste, Guaranys, Potyguaras, Kariris.

Nos últymos anos fomos ganhando mays partycypantes,  Luã Apiká como lynguýsta pela pesquysa em letras, responsável pelo regystro, fortalecimento e tradução das falas em Tupy, Nenêm Mirindju que tynha ydo no encontro ynycyal lá em 2017 voltou a estar junto, os rappers Tuká e Kwaray O’ea na dança dos xondaro e na musycalydade, a fytoterapeuta Simone Takuá com o vasto conhecymento na lýngua, Ana Paula Dina Elísio, com o conhecymento das ervas, na coordenação das alymentações e encontros, dentre tantas outras pessoas que chegaram junto, para contrybuyr e partycypar.

A presença promyssora na terra Piaçawera me fez voltar pra mynha terra em estado de florescymento, e também oferecer ofycynas de Teatro para três dos 16 terrytóryos polytycamente organyzados no Ryo Grande do Norte. Sou cydadão yndýgena, comunycador da APIRN – Artyculação dos Povos Yndýgenas do Ryo Grande do Norte, honro demays a luta e conscyêncya dos meus, que vyeram e que estão nessa batalha de ymagynáryos e narratyvas fýsycas, desde antes. Com a permyssão de Luiz Katu, fuy contracolonyzar com os Potyguaras do Eleotéryos do Catu, com a lycença de Tayse Campus fuy pulsar a ressurgêncya com os Mendonças do Amarelão e com a bença de Francisca e Zuleide, fuy ecoar a etnogênese através do Teatro na Lagoa do Tapará na expectatyva de um dya retomar com força a potêncya desses encontros numa terra sem polýtycas públycas para cultura e revolucyonar esse estado tão adverso para nossas exystêncyas. Como Potyguara, comedor de camarão e de fumo, que brotou da dessertyfycação do cymento que devorou tudo na esquyna do contynente, como a assombração brava gentyl que os holandeses e portugueses não conseguyram ceyfar, nem os norte-amerycanos conseguyram soterrar, reelaboro mynha exystêncya e ydentydade através da deformação de uma arte colonyal, afynal, tudo é ferramenta.

Como cytado anteryormente, através de documentos e escrytos, até do própryo Padre José de Anchyeta, temos o dado hystóryco de que o Teatro foy a prymeyra lynguagem artýstyca a colonyzar e gerar a unyfycação que hoje é conhecyda como Brasyl, homenagem aos trafycantes da árvore de mesmo nome. Lendo Kaká Werá em conversa com Zé Celso Martinez, conscyentyzey: o Teatro Contemporâneo de nada serve a essa terra se não servyr para de(s)colonyzar e de(s)catequyzar. Teatro: lugar de onde se vê. Eles nunca nos vyram. A gente dá aula de vysão, seja nos Torés, nos Mborais, na dança dos xondaros ou outros rytuays cyrculares, nos organyzamos onde todos se veem, onde todos são vystos. MA’E YYRAMÕI  – MAR À VYSTA quanto obra presencyal aynda não exyste, esse ano será lançada como dramaturgya pelo PROAC, mas é uma semente, uma potêncya contracolonyal que já está entre nós, não mays só nos sylêncyos, não mays apenas nos sangues, pretende ser uma peça que acontecerá todo ano, num rytual coletyvo, num Ka’atymbó à beyra-mar para construyr terrytóryos ymagynáryos e fýsycos de dygnydade para os corpos e culturas yndýgenas nas Artes da Cena. Se preparem para o Contrateatro.

 

AUTOR

Juão Nyn, multyartysta, atua na performance, no teatro, no cynema e na músyca. Potyguar(a), comunycador do movymento yndýgena pela APIRN, yntegrante do Coletyvo Estopô Balayo de Cryação, Memórya e Narratyva, da Cya. de Arte Teatro Ynterrompydo e vocalysta/composytor da banda Androyde Sem Par. Formado em Lycencyatura em Teatro pela UFRN, está há sete anos em trânsyto entre Natal e São Paulo.