Atitude tempestiva para tempos insólitos
Joviano Maia Mayer
Falar de encruzilhada é falar a partir do entre. E entre o bolsonarismo e o campo democrático não há apenas divergência, mas também um entendimento comum: para ambos, vivemos um momento histórico marcante, de proporção incomensurável. As próximas eleições são determinantes para o futuro da nação, e creio que haja consenso em torno disso. Quiçá a eleição mais importante das nossas vidas.
Por essa razão, o momento nos cobra engajamento efetivo e métodos adequados para a conquista de votos favoráveis à vitória do campo democrático no próximo dia 30 de outubro. O lado de lá faz um jogo bastante sujo, com uso indevido da máquina pública e balas de fuzis e granadas lançadas contra agentes da polícia federal, um criminoso e desenfreado assédio eleitoral nas empresas e igrejas, bilhões do orçamento secreto e a imposição do medo pela violência. Estão efetivamente dispostos a tudo para virar o jogo. Resta evidente que lutamos contra o fascismo. Na verdade, nem precisamos tanto de métodos adequados, mas principalmente de atitude, como dizia Franz Fanon. Qual será a nossa atitude para impedir o aprofundamento do projeto colonial-racista-patriarcal (bell hooks) representado pelo bolsonarismo?
A luta é contracolonialista e deve ser travada em todos os campos da vida: familiar, comunitária, profissional, artística, escolar, espiritual etc. O território, entendido em sentido amplo, assume aqui uma dimensão central: atuar nos territórios, organizar nossos territórios, ampliar nossos territórios, criar novos territórios, sermos territórios. Quanto mais territórios, mais encruzilhadas. Quanto mais encruzilhadas, mais caminhos, mais “territórios de confluência energética” (Cidinha da Silva) para a gente se fortalecer. E é na encruzilhada que a gente se fortalece, o território se fortalece, a comunidade se fortalece. Ainda não estamos numa encruzilhada, precisamos forjá-la, abrir novos caminhos e rejeitar os binarismos.
O território jamais poderá ser completamente substituído pelo virtual. E a ação territorial, comunitária, o velho corpo a corpo, o diálogo amoroso, com olhos nos olhos, em minha opinião, deveria ser a prioridade nesta reta final – sem prejuízo na contraofensiva digital necessária diante da avalanche de fake news. Em termos massivos, devem-se orientar os esforços para o vira–voto corpo a corpo, sem perder tempo tentando convencer bolsonaristas convictos.
Repito: atitude. Agir para além das redes sociais, subterraneamente, fora do controle dos algoritmos. Conversar com as pessoas que cruzam nossos caminhos nas ruas e praças, nos pontos de ônibus, comércios e comunidades, nos territórios. É tarefa primordial furar as bolhas das redes sociais que no mundo todo, e aqui também, favorecem a extrema direita.
É o tal trabalho de formiguinha, mas em caráter de urgência – com formiguinhas a poucos dias de definir os rumos do formigueiro. Pisando ligeiro. Se essa é uma batalha que deixa evidente o caráter contracolonialista da resistência, devemos primeiro olhar para as históricas lutas de resistência dos povos afro–indígenas no Brasil. A República dos Palmares, por exemplo, resistiu por cem anos de luta e autogestão contracolonialista heroicas. Como reagiriam os (as) combatentes palmarinos (as) diante de mais uma ofensiva colonial?
Esse raciocínio me parece interessante, pois vejo a possibilidade de vitória do bolsonarismo como uma nova investida bandeirante. Domingos Jorge Velho empunha suas armas contra o Brasil quilombola contemporâneo, e precisamos derrotá-lo. Como? São múltiplas as respostas, muitos os caminhos, várias encruzilhadas e uma certeza: atitude.